Encontrar algo útil no meio da tralha é parte essencial do trabalho de um historiador.

sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Vai ser sempre a abrir com Nestum sempre ao teu lado


Jornal Português de Economia & Finanças, 1 a 15 de Junho de 1974

“Os fascistas eram realmente pessoas insuportáveis na sua estúpida presunção de terem a verdade na algibeira. É certo que respeitavam as ideias alheias e, de uma maneira geral, quem não era activista podia ser impunemente o que quisesse. Felizmente esses tempos de opressão passaram. Agora – contra, aliás, o programa da Junta de Salvação Nacional a que toda a gente, ou quase, aderiu – quem não é das esquerdas não pode ser funcionário, não pode ser professor, não pode ser empregado e quase não pode ser patrão. É justo, claro. Para lhes ensinar o que é a liberdade. Neste sentido, os alunos da Faculdade de Direito de Coimbra proibiram aos professores e assistentes de ideias contrárias aos partidos das esquerdas, de voltarem a leccionar.” (p. 51)

A França é a Besta do Apocalipse


A Bíblia do FC Porto (Prime Books, 2010) acabou por chegar pela pena de João Pedro Bandeira. Embora mal informado sobre a data da conquista de Ceuta (foi em 1415 e não em 1914), o autor apresenta uma obra bastante actualizada, fazendo referência à vitória sobre o Benfica de 7 de Novembro passado, embora ainda inclua Pôncio Monteiro entre os portistas vivos. Uma das letras de canções sobre o FC Porto reproduzidas no livro (“O Porto Está na Rua”, de 2006) pertence a Carlos Tê, mas falta “Um Pouco Mais de Azul”, tema de Tê gravado em 2003 que constitui o melhor trabalho musical acerca dos “dragões”. Na entrada “Futebol total” (pp. 202-203), é feita a contabilização dos títulos oficiais obtidos no futebol (incluindo todos os escalões, a partir dos infantis) pelos “grandes” portugueses, com o FCP a bater o SLB por 118-112. Se for abordada apenas a categoria dos seniores, as “águias” possuem uma curta vantagem (68-66, com o SCP a ficar-se pelos 44). Os adeptos portistas esperam que a equipa de André Villas-Boas consiga na actual temporada atingir pelo menos o empate, através da conquista da Liga Zon Sagres e da Taça de Portugal.

quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Orelhas, estou aqui


O grupo de apoio a Cavaco Silva “Nós Acreditamos”, no qual se procurou reunir jovens (menores de 35 anos?) empreendedores e bem sucedidos nas suas áreas, inclui vários atletas, frequentemente detentores de títulos nacionais ou membros de selecções representativas do país. Na lista divulgada, encontram-se os desportistas António Aguilar (rugby), Bruno Barracosa (presidente da Federação Portuguesa de Desporto Universitário), Bruno Pais (triatlo), Diana Ribeiro (patinagem artística), Francisco Lobato (vela), João André (salto à vara), João Benedito (futsal), João Meneses (surf), Luís Ahrens Teixeira (remo), Marina Frutuoso de Melo (obstáculos), Miguel Ximenez (surf), Moreira (futebol), Nelson (futebol), Pedro Martins (badminton), Sérgio Paulinho (ciclismo) e Vasco Uva (rugby).

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Morrer por morrer, morra o meu pai que é mais velho


Os prémios relativos à temporada de 1974/75 atribuídos pelo Clube Nacional de Imprensa Desportiva (CNID) contemplaram Humberto Coelho (Futebolista do Ano), Carlos Lopes (Atleta do Ano) e Fernando Chalana (Revelação do Ano). Enquanto Lopes arrebatava o galardão sucessivamente desde 1972, Chalana, ainda júnior do Benfica mas cujo talento fazia antever uma chegada rápida à equipa principal do clube e à selecção A, conseguiu maior número de votos que Rosa Mota, campeã nacional dos 1500 e 3000 metros.

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Oh geração que depois veio, povo bem aventurado


Hugo Daniel Sousa aborda num artigo do Público a geografia do futebol profissional português, tão litoralizado como o país. Para lá do “esfumar” dos clubes mais pequenos de Lisboa e Porto, que Boavista e Belenenses conhecem actualmente, o poder de atracção exercido por SLB, SCP e FCP nas regiões onde se situam os seus estádios contribui para a dificuldade de desenvolvimento de colectividades com aspirações elevadas nos subúrbios das principais cidades portuguesas. No caso do Odivelas FC, acho que sempre foi relativamente ténue a ligação da cidade ao clube local, prejudicado pelos “grandes” vizinhos e pela falta de espírito bairrista.

domingo, 26 de dezembro de 2010

Durma, xerife, bem descansado


De acordo com o depoimento de Fernando Madureira (Macaco) registado por Filipe Bastos no livro Fernando Madureira, O Líder (O Gaiense, 2005), a tarefa do chefe da claque Super Dragões (SD) é comparável à de “uma educadora de infância sempre a ver onde é que as crianças estavam a fazer asneiras” (p. 60). De facto, são inúmeras as situações referidas no livro em que Macaco tem de negociar com a polícia a libertação dos “ultras” detidos ou exigir que os “gaiatos” devolvam objectos roubados. No entanto, surgem como habituais e mesmo inevitáveis as “rapadelas” dos SD em estações de serviço ou free shops de aeroportos. Nem a megastore do Manchester United escapou em 1997 à perícia da claque portista, na qual vários jovens encontram uma alternativa à heroína e ao crime organizado.

Embora as memórias de Madureira incluam os anos dourados de José Mourinho, tal como a derrocada em 2004/05, o que se passa nos relvados acaba por ter escassa relevância, perante a abundância de peripécias ligadas às deslocações dos SD. Entre estas incluem-se as batalhas, no sentido literal, contra os No Name Boys (as relações dos SD com a claque dos Diabos Vermelhos são mais pacíficas, enquanto Macaco dá ordens para que não se verifiquem agressões a “pessoas normais”, ou seja, benfiquistas civis). Nos recontros, além da supremacia pela força, a tomada de presas valiosas (faixas e estandartes da claque rival) assume grande importância. 

O livro de Filipe Bastos acaba por demonstrar que o mundo do futebol inclui histórias pessoais que ultrapassam a imaginação dos ficcionistas. Pelo menos, as “aventuras” de Macaco e outras personagens dos SD como Futre, Bruno Pidá, Afurada, Cult, Trilho, Caveira, Teixeira, Pili, Terror, Leitinho e muitos mais registam experiências vividas por poucas pessoas, quanto mais não seja pelo descaramento dos intervenientes.

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

O Bruce Willis é altamente


Para além do ataque de riso (envolvendo vacas e javalis), a presença de José Cid no programa ShowMarkl (canal Q) ficou marcada pela atitude depreciativa do músico em relação à canção Um Grande, Grande Amor, considerada por Cid claramente inferior a outras participações suas no Festival da Canção. Mesmo assim, gosto bastante do tema de 1980, talvez precisamente por ser a misturada de influências de que o autor falou. Quanto aos êxitos de 1983-84 que Cid também “renegou”, Amar como Jesus Amou e Portuguesa Bonita, são de facto momentos infelizes da sua carreira, mas pelo menos tiveram grande retorno a nível financeiro.
Um acontecimento que Cid nunca digeriu bem foi a derrota no Festival da RTP de 1974, onde Paulo de Carvalho obteve com E Depois do Adeus (grande interpretação) o bilhete para a Eurovisão e o prémio extra desse ano, a participação como primeira senha no 25 de Abril. Recorde-se que nessa edição Cid atacou em três frentes, cantando a solo A Rosa que Te Dei e integrando os Green Windows (e não Green Widows, como surge impresso na capa de uma compilação recente) em Imagens e No Dia em que o Rei Fez Anos. Esta última era a principal candidata à vitória, mas ficou-se pelo 2º lugar, para indignação de José Cid, que atribuiu (e atribui) a votação a jogos de bastidores. Para a imprensa da altura, o Festival de 1974 foi fraco, tendo Cid sido zurzido pelo seu fiel “inimigo” Mário Castrim. Em 1978, Cid chegou a interpretar na RTP quatro temas, incluindo O Meu Piano, sem conseguir o primeiro posto. Estava destinado que 1980 seria o ano da cor e do sucesso do cantor ribatejano.
No programa de Nuno Markl, José Cid aproveitou ainda para atacar Tony Carreira, falando de excursões de gente feia e desdentada vinda de Trás-os-Montes para o Pavilhão Atlântico, e revelar que o próximo álbum da “mãe do rock português” se deverá chamar Baladas do Arco-Íris e incluir um regresso a Partindo-se, tema de raiz medieval gravado pelo Quarteto 1111 em 1968.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Finta um, finta dois e passa por três


Voz do Povo, 25 de Março de 1975

“Os militares e civis do Forte de Caxias, da Comissão de Extinção da PIDE/DGS e LP e da Comissão “Ad hoc” para o 28 de Setembro, reunidos em Assembleia na madrugada de 12 de Março, apoiam as justas posições dos camaradas do RAL 1 expressas no seu comunicado, exigindo o imediato fuzilamento de todos os fascistas implicados na intentona contra-revolucionária.
(Aprovado por maioria)
Foi aprovada outra proposta de constituição dum Tribunal Revolucionário para julgar os implicados na conspiração contra-revolucionária de 11 de Março, do qual façam parte elementos do RAL 1.
— Lanceiros 2 apoiou também uma proposta de fuzilamento dos fascistas.” (p. 8)

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Nada se compara ao prazer de escolher


Na edição de Janeiro de 1985 da Foot, o futebolista Nené, jogador do Benfica desde a sua vinda de Moçambique, quase duas décadas antes, admitia a possibilidade, chocante para os adeptos, de mudar de clube. O problema não estava nas capacidades de Nené, que ainda se julgava capaz de competir ao mais alto nível, mas na situação da equipa benfiquista desde a chegada ao comando técnico do húngaro Pal Csernai, que sucedera a Eriksson no início da temporada de 1984/85. Também entrevistado nesse número da revista, Csernai promovera uma renovação do onze “encarnado” através da aposta em jovens como Samuel e Vando e do afastamento dos jogadores mais idosos, como Nené, que fizera apenas dois jogos na época então em curso. Depois dos tempos gloriosos de Eriksson, predominava o mal-estar entre os jogadores do SLB, como Pietra já dera a entender na edição do mês anterior da Foot. Nené acabaria por permanecer no Benfica até terminar a carreira em 1986. Crescentemente contestado, Csernai seria arredado da liderança ainda antes da final da Taça de Portugal de 1984/85, vencida pelo SLB (3-2 contra o FC Porto), cujo alinhamento no Jamor foi coordenado por Pietra e Carlos Manuel. A passagem de Csernai (que treinara o Bayern de Munique e passaria depois pela selecção da Coreia do Norte) pela Luz seria recordada como o equivalente na história benfiquista do reinado de Calígula em Roma.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Peça tocada é peça jogada


Voz do Povo, 1 de Outubro de 1974

“ (…) Inspirados no grande exemplo de combatividade e organização de 28 de Setembro, desencadeamos a ofensiva pelas reivindicações políticas imediatas da classe operária e do povo:
— LIMPEZA RADICAL À ESCUMALHA FASCISTA! Fora com os fascistas dos lugares que ainda conservam! Justiça popular contra a Pide! Nem mais um pide para a rua! Dissolução da GNR! Calemos a imprensa fascista! Formemos mais e mais comités de vigilância e acção anti-fascista! (…)” (p. 2)

A Coimbra vão os tolos, e cá ficam os avisados


Na noite de 2 de Setembro de 2002, a escultura da pantera, símbolo do Boavista, foi pintada de azul. A iniciativa de adeptos portistas, acompanhada por frases injuriosas contra os Loureiro escritas na sede do BFC, foi classificada como acto de vandalismo. Marco Alves refere a pantera coberta de tinta azul (em As Manobras de Pinto da Costa), como uma das acções resultantes do clima de ódio estabelecido no futebol português pelo presidente portista, então em guerra com Valentim Loureiro. No entanto, o sportinguista Pedro Vasco, na obra O Meu Primeiro Livro do Sporting (Prime Books, 2010), conta um episódio ocorrido em 20 de Maio de 1972, antes de um SLB-SCP, quando a imponente águia do Estádio da Luz foi pintada por quatro jovens. A ave de pedra passou então a vestir de verde e branco. Para Vasco, tal não constituiu um delito, mas sim uma prova de que o Sporting é “o clube com mais sentido de humor em Portugal” (p. 128). O problema destas obras de arte pública é que nem todos gostam delas.    

domingo, 19 de dezembro de 2010

Teus olhos para mim são fatais


Na sua Comissão de Honra, o candidato presidencial Manuel Alegre inclui um vasto conjunto de personalidades ligadas ao futebol. Muitos dos membros do “plantel” do autor de O Futebol e a Vida estiveram ligados à selecção nacional, como jogadores ou técnicos. Assim, a equipa alegrista conta com Agostinho Oliveira, Ângelo, Artur Correia, Augusto Inácio, Bernardino Pedroto, Carlos Manuel, Chalana, Henrique Calisto, Hilário, Jaime Pacheco, Jesualdo Ferreira, Jorge Costa, José Augusto, Manuel Fernandes, Manuel José, Mário Wilson, Pedro Gomes, Romeu, Simões, Toni e Veloso. Os jornalistas Afonso de Melo, João Malheiro e Vítor Serpa também vestem a camisola do candidato. Luís Filipe Vieira não deixou de ceder o seu apoio a um adepto do Benfica, mas Rogério de Brito, vice-presidente do Sporting, contribui para o pluralismo clubístico. Nenhuma mulher do futebol surge referida na lista (embora esta inclua a arquitecta Manuela Carmona – a primeira mulher de Pinto da Costa?). Todos estes nomes constituem uma formação de valor. No entanto, a equipa de Cavaco Silva tem Eusébio no ataque e Vítor Baía na baliza, o que é quase garantia de vitória.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Um português que cai a combater não morre nunca


E se, mais que escrever livros, uma boa maneira de promover o desporto fosse criar um clube e ensinar crianças a jogar futsal? Foi o que fez Ricardo Serrado, um dos fundadores e treinador principal do Atlético Queijas. Em actividade desde Setembro de 2010, o Atlético Queijas possui equipas de futsal nos escalões de escolinhas, benjamins e infantis, participando nas provas da AF Lisboa relativas aos dois últimos. Mais informações podem ser obtidas na página da colectividade no Facebook.

Não somos massa dum todo?


A leitura de As Manobras de Pinto da Costa (Zebra, 2010), onde o jornalista Marco Alves (cuja fotografia não foi publicada, provavelmente devido a receio de represálias) se baseia numa exaustiva pesquisa de imprensa para narrar os quase 30 anos de gestão do FC Porto pelo mesmo homem, dá a entender que a alma de Jorge Nuno é mais suja que a retrete do Estádio das Antas penhorada em Março de 1994. O próprio autor revela alguma estupefacção provocada pela ousadia das acções do presidente portista. Surge-nos uma figura voluntariamente guerreira cuja vida foi dedicada a conquistar, manter e alargar o poder, sem barreiras éticas e com toques de génio. É preciso ter em conta que a Superliga portuguesa, mais que uma competição desportiva, é uma luta pelo poder, sobretudo entre os “grandes”.

Fica assim provado que a vida real consegue criar personagens mais fascinantes que as da ficção (Pinto da Costa já foi interpretado no cinema por Nicolau Breyner, mas o resultado global do filme Corrupção é bastante fraco). O mais notável é que esta história ainda não acabou, continuando todos os dias nas páginas dos jornais desportivos e das revistas cor-de-rosa. Como irá terminar este filme? No romance Golpe de Estádio, Marinho Neves imaginou o personagem que representa Pinto da Costa a falecer num desastre de viação a caminho de Fátima. Acho que uma boa cena final poderia mostrar Jorge Nuno sozinho no meio de um Estádio do Dragão deserto, a ponderar se tudo valeu a pena (terminar com grande plano). Outros imaginariam uma conclusão mais dramática que apresentasse uma lição moral.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

O mundo pára e a prima chora


UEC, 30 de Outubro de 1975

“ (…) Vítor Alves, MEIC e a sua brilhante equipa, um mês passado sobre a data em que se apossaram do Ministério, nada fizeram que se visse!
Perdão! Fizeram sim senhor: saneamentos à esquerda e reintegração de fascistas saneados!
Os fascistas, toda a espécie de reaccionários e de incompetentes saneados estão a ser reintegrados pelo MEIC. Incluindo um ex-ministro (…) – Hermano Saraiva!
Disto não falou Vítor Alves.
Mas a isto estão muito atentos os estudantes portugueses. Muito atentos e em firmes posições de luta. Como o sr. Ministro em breve descobrirá, os fascistas não voltarão a entrar nas escolas! (…)
PENSA O MEIC INSISTIR NA REINTEGRAÇÃO DE REACCIONÁRIOS JÁ SANEADOS?
A este respeito pode o sr. Ministro estar certo de que os estudantes não permitirão que os reaccionários retornem às escolas; e mais!, que o saneamento vai prosseguir até que o aparelho de ensino esteja totalmente liberto de fascistas, de reaccionários, de sabotadores!”

domingo, 12 de dezembro de 2010

Bola minha querida mãe


O primeiro título português do filme dos Monty Python (conhecidos em Portugal desde 1975 pela série Os Malucos do Circo) And Now for Something Completely Different foi Os Gloriosos Malucos à Solta. A associação entre a loucura e a comédia está presente em numerosos títulos de produções para o cinema e a televisão: Doido por Ti, Doido com Juízo, Cidade Louca, As Malucas das Cabeleireiras, Doidos à Solta, Os Malucos do Riso, A Mais Louca Odisseia no Espaço, Malucos no Divã, A Gaiola das Malucas, Loucos e Fãs, Marados à Solta, Marados da Dança, Está Tudo Louco!, Loucuras em Las Vegas, A Louca Academia de Ski, As Loucuras de uma Recruta, Louco de Amor, O Professor Chanfrado, Loucos por Dólares, Dias de Loucura, Doidos por Mary, O Mundo Maluco, A Minha Namorada é Louca, Um Dia de Doidos, Solteiros e Tarados, etc. Porque parece a loucura tão divertida? Talvez por fugir da normalidade e assim subverter a realidade, ou por causa do provérbio “Muito riso, pouco siso”. Na verdade, as doenças mentais nada têm de engraçado, sobretudo para quem delas sofre.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Alto, mais alto, ninguém nos vai parar


João Pedro Bandeira escreveu Bíblia dos Anos 80 (Prime Books, 2010), um livro que prova que ainda é possível ter ideias verdadeiramente originais (ironia). Com prefácio de Rui Veloso, a obra adapta o formato criado por Luís Miguel Pereira ao espírito nostálgico que atingiu o auge nos Coliseus de Lisboa e Porto. As entradas fornecem informações deliciosamente supérfluas acerca de música, televisão, cinema, acontecimentos internacionais e outros aspectos da penúltima década do século XX. Não sei o que pensa Nuno Markl ao ver outra foice na sua seara, mas o trabalho de Bandeira pode servir como complemento à Caderneta de Cromos.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Em terra de capados quem tem um testículo é rei


No livro A TV do Futebol (Campo das Letras, 2006), coordenado por Felisbela Lopes e Sara Pereira, académicos e jornalistas analisam, em vésperas do Mundial, a relação actual entre o futebol e a televisão. O crítico de televisão Eduardo Cintra Torres, autor do artigo “O telepatriotismo durante o Euro 2004”, reproduz o discurso e o conteúdo das emissões da RTP sobre a competição, dando a entender que aquilo que a estação pública fez em Junho e Julho de 2004 foi propaganda “patriótica” e não jornalismo. No entanto, o jornalista Carlos Daniel, um dos rostos da RTP durante esses dias de Verão e outro dos co-autores da obra, não se arrepende de ter literalmente vestido o cachecol da selecção portuguesa: “Não acredito no relato jornalístico desprovido de emoção, quando estamos perante um fenómeno que vive dela e da qual não se consegue separar. (…) Se a notícia tem emoção, o jornalista não pode deixar de a retratar. Ser impenetrável a essa emoção, será, na minha perspectiva, não apenas inviável como indesejável.” (p. 42) 

A euforia patriótica em torno da selecção principal da FPF mostrada e apoiada pela televisão repetir-se-ia em moldes semelhantes de dois em dois anos, nas fases finais seguintes. Põe-se a questão de saber se os canais generalistas portugueses fabricaram a ligação da Nação a uma equipa de futebol de modo a ganharem audiências para as transmissões dos jogos e os muitos outros programas à volta das competições ou se foi o público a “exigir” da televisão uma cobertura mediática exaustiva e um discurso emocional e patriótico. Será que a resposta varia conforme a pergunta se dirija a crentes ou não crentes no futebol?

domingo, 5 de dezembro de 2010

Roda o mundo pelas estradas do céu


Ver alguns dos filmes de Stanley Kubrick (Horizontes de Glória, Dr. Estranho Amor…, Nascido para Matar) é de certa forma uma homenagem à memória de Francisco Sá Carneiro. Perante a perspectiva do realizador sobre a (in) competência e a (in) sanidade mental dos oficiais militares, é difícil compreender como o Conselho da Revolução perdurou até 1982.

Se a prof. Maria Inácia Rezola ler isto, é claro que não estou a comparar Vasco Lourenço, Melo Antunes e outros autores do 25 de Abril com personagens como os generais Mireau e Ripper. No entanto, as atitudes de muitos militares portugueses durante o PREC confirmam a impressão de que é arriscado confiar em gente fardada.

sábado, 4 de dezembro de 2010

Aquele que está vivo não diga nunca "nunca"


Foot, Dezembro de 1984

Entrevista de Hugo dos Santos a Paulo Futre:

“ (…) Futebol, música e televisão (vídeo) enchem, por inteiro, a vida deste jovem. Do futebol fala ele com reservas bem no jeito de não querer criar qualquer espécie de complicações. É diferente, por exemplo, quando nos fala de música:
— A música, para a juventude de hoje, e para mim, é tudo. A música a nós, faz-nos esquecer a política, faz-nos esquecer até a crise.
Não deixamos passar a frase, sem interferirmos:
— Não venho lá dos confins do século. Sou de uma geração própria e muito marcada pela música dos anos sessenta. Para nós, no nosso tempo de juventude, a música era muito, mas estava longe de ser tudo. Havia os grandes movimentos da juventude, o Maio de “68” em França, o movimento “Hippy”, os pacifistas, os ideais, a noção bela de que, talvez por sermos jovens, seríamos capazes de transformar o mundo. Para vocês é assim tão diferente o tempo de hoje?
— É. Para nós é viver a vida pela vida. A nossa política é a música.
— E não vos assusta, por exemplo, a ameaça de uma guerra nuclear?
— Assusta, mas que podemos fazer?
— Não podem lutar, para que seja menos possível?
— Acho que não. Basta um louco qualquer carregar num botão e, pronto, acontece.” (p. 30)

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

I just love the evilness


Segundo o Diário de Lisboa de 1 de Fevereiro de 1977, a editora discográfica Valentim de Carvalho promoveu uma excursão a Paris entre os dias 23 e 27 de Fevereiro desse ano. O objectivo dos participantes seria assistir ao concerto que os Pink Floyd iriam realizar na capital francesa. Em troca de 4 mil escudos, seriam disponibilizados a viagem a Paris (de autocarro), a estadia, um bilhete para o concerto e um exemplar do novo disco da banda inglesa, Animals. O mesmo jornal informa igualmente que o jogo de futebol Benfica-Sporting de 30 de Janeiro atingiu o recorde de assistência de mais de 90 mil pessoas, correspondentes a uma receita total de 4 511 000 escudos.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Então, tchau


Diário de Lisboa, suplemento 7.7, 29 de Janeiro de 1977

O Raid Relâmpago dos Comandos
de Irvin Kershner
(USA-1976)

Um filme do domínio do insulto (bis) e da pornografia (bis).
O nojo é ainda o sentimento que nos resta.
(Quem quer perder tempo e prosa?)

Cinema Condes
(não acons. men. 13 a.)”

É preciso explicar que a repugnância do DL não se deve apenas à eventual baixa qualidade artística do filme (que não vi) do realizador recentemente falecido de O Império Contra-Ataca. Com Peter Finch, Charles Bronson e Yapeth Kotto, a obra de Kershner relata a “Operação Entebbe”, ocorrida em Junho de 1976, quando terroristas da Frente Popular de Libertação da Palestina desviaram um avião de passageiros (sobretudo judeus)  da Air France para o aeroporto de Entebbe, no Uganda (contavam com o apoio do ditador Idi Amin), exigindo a libertação de 53 correligionários, presos maioritariamente em Israel. O governo israelita respondeu lançando uma espectacular operação militar bem sucedida que resultou na libertação dos reféns, quase sem baixas entre os judeus. Como é natural, o filme, originalmente feito para televisão e intitulado Raid on Entebbe, adopta o ponto de vista de Israel e dá contornos heróicos à acção militar. No início de 1977, é também exibida em Lisboa a película sobre o mesmo tema Vitória em Entebbe, de Marvin J. Chomsky, que conta com actores como Richard Dreyfuss, Anthony Hopkins e Elizabeth Taylor. Sectores de esquerda manifestam-se indignados contra a propaganda “sionista” e “imperialista”, num cenário agravado pelo contexto da Guerra Fria. Engenhos explosivos serão encontrados no cinema que exibe Vitória em Entebbe, o qual acaba por beneficiar da publicidade dada ao filme, na origem do aumento do número de espectadores.