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quinta-feira, 23 de maio de 2013

Comedores de lagosta com os impostos do povo


Director da PIP (Polícia Internacional Portuguesa) desde 1931 e da PVDE (Polícia de Vigilância e Defesa do Estado) a partir de 1933, o capitão Agostinho Lourenço, homem de confiança de Salazar, preocupou-se em reforçar a disciplina dos funcionários da polícia política, com o objectivo de evitar comportamentos que prejudicassem a imagem desta, especialmente junto de outras entidades estatais (segundo Lourenço, quando assumiu a liderança da PIP, antes da depuração que levou a cabo, eram frequentes os conflitos e queixas das autoridades locais em relação à má qualidade profissional dos agentes). As ordens de serviço dos primeiros anos de vida da PVDE incluem numerosas punições a funcionários desta, justificadas por motivos como corrupção, abuso de autoridade ou desleixo no cumprimento do dever (maus tratos a prisioneiros não são causa de punição). São igualmente frequentes as directivas de Lourenço no sentido dos seus subordinados evitarem situações embaraçosas para o prestígio da PVDE, como o contacto dos agentes com prostitutas. Na OS nº 173, de 22 de Junho de 1934, encontra-se um exemplo das sanções aplicadas aos “elementos maus” da polícia, que poderiam ir da repreensão averbada à expulsão da PVDE, dependendo da gravidade da falta e do comportamento anterior do visado:

“Que seja punido com dez dias de suspensão de exercício e vencimento, o agente José Júdice Leote Cavaco, porque, valendo-se da sua situação de agente desta Polícia e esquecendo as recomendações mais de uma vez feitas, interveio numa questão passada entre duas mulheres de vida fácil, com uma das quais está amancebado e tendo tomado o partido desta, entrou violentamente em casa da outra, invocando a sua autoridade, para a invectivar e ameaçar com prisão. Este agente esqueceu-se do respeito que deve a si próprio e à Corporação a que pertence e demonstrou não ter exacto conhecimento da responsabilidade que advém da autoridade de que qualquer funcionário policial está investido, autoridade que não se deve exorbitar para se não cair no ridículo ou na censura do público a cujo respeito e consideração só se poderá impor pelo seu porte moral e correcto proceder.”

Em Outubro desse ano, José Cavaco “marchou em diligência” no dia 4, regressando dois dias depois, e voltou a executar uma missão em 10 de Outubro. No entanto, a ordem de serviço nº 286, de 13 de Outubro de 1934, inclui o seguinte despacho: “Que seja demitido desde 11 do corrente, por ter abandonado o serviço nessa data, o agente nº 56/56 da SI (Secção Internacional), José Júdice Leote Cavaco.”

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