Encontrar algo útil no meio da tralha é parte essencial do trabalho de um historiador.

terça-feira, 30 de novembro de 2010

A minha vida só está completa enquanto houver televisão


No número de Setembro de 1985 da revista Foot, o “convidado do mês” é o futebolista búlgaro Vanio Kostov, ex-jogador do Sporting agora no Belenenses. Respondendo às perguntas de leitores da publicação, Kostov começa por abordar o problema da violência no futebol: “Julgo que isto é um bocado consequência da liberdade a mais em que as pessoas vivem, pois nos regimes férreos, como no Leste, tal não se passa. Recentemente, houve problemas na final da Taça da Bulgária, que estiveram na origem da dissolução de dois clubes, mas tudo se passou apenas entre os jogadores e o árbitro, pois com os espectadores não havia hipóteses de se passar alguma coisa. Mesmo assim o mal foi cortado logo pela raiz.” Depois de assinalar as virtudes do socialismo científico, o atleta ouve a questão “A SIDA também o preocupa?” (enviada por Anabela Vasconcelos, de S. João do Estoril). Kostov responde: “Não me preocupa pessoalmente, pois não poderei apanhá-la, mas preocupa-me porque é uma doença muito perigosa e que poderá causar sérios problemas à Humanidade. O que me aflige mais e não consigo perceber é o facto de ainda não se vislumbrar qualquer hipótese de cura.” Acreditaria Kostov que, por não ser homossexual, possuía imunidade à nova doença? Curiosamente, a mesma edição da Foot inclui uma fotografia de Kostov e dois outros jogadores belenenses rodeados de belas mulheres. Na entrevista, o futebolista búlgaro afirma não ponderar para já a hipótese de se casar, enquanto aguarda a dissolução do matrimónio através do qual o Sporting lhe assegurou a nacionalidade portuguesa (as limitações à utilização de jogadores estrangeiros só desapareceriam em 1996, depois da “lei Bosman”). Na verdade, foi no ano de 1985 que nasceu a sua filha Sara Kostov, futura actriz/modelo.

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

O desencanto é tão seco como a luz que me rodeia


Diário de Lisboa, 22 de Janeiro de 1977

Mário Castrim: “(…) Primeiro foi aquele programa desportivo (Momento Desportivo), com apresentador excessivamente loquaz e nervoso. Em discussão o futebol. Projectos de alteração às leis, ainda em regime de experiência. Meia hora, ai que bom! Ai que bom, futebol! Pois claro, como dizia o outro: o que nós queremos é bola...
Além do apresentador, vieram os senhores Américo Barradas, que é arbitro; Fernando Vaz, que é treinador; e Toni, que joga.
Como já disse, foi uma grande jogatana! Ah, futebol de um raio que assim é que é falar! Que saudades eu já tinha de ouvir futebol na televisão, discussões, teses, antíteses, profundos blá-blás! Parece que me sinto transportado aos tempos do Lança Moreira!
Parece que há para aí uns problemas, não sei quê independência nacional, não sei quê Reforma Agrária, não sei quê os rendeiros do Norte em luta pela aplicação da Lei do Arrendamento. Mas o que é isto, sim, o que é isto comparado com o futebol?
Não há direito ser só meia hora. Protesto. Os portugueses exigem pelo menos quatro horas de futebol por dia. (…)” (p. 15)

sábado, 27 de novembro de 2010

Fogo sobre o revisionismo


A notícia do fim do programa Contra-Informação não provoca grande choque, até porque a sua exibição na RTP era actualmente quase clandestina. 15 anos são muito tempo e os textos de José de Pina, Rui Cardoso Martins e Filipe Homem Fonseca já tinham perdido a graça e a imaginação, prejudicados pela concorrência na área do humor, como O Inimigo Público. No entanto, é impossível esquecer o impacto histórico e mediático que Contra-Informação possuiu pelo menos nos 10 primeiros anos no ar. A dessacralização dos políticos portugueses atingiu o auge através da sátira corrosiva da bonecada, composta por personagens por vezes bem mais populares e carismáticas que os modelos originais. Nenhum partido escapou às piadas do programa, embora os argumentistas se inclinem para a esquerda, tendo criticado violentamente a guerra no Iraque e a decisão sampaísta de empossar Santana Lopes (é difícil contar a história deste político sem mostrar imagens do boneco Santana Flopes). Os principais dirigentes do futebol português, que chegaram a ter um programa próprio (Bar da Liga), também foram alvos privilegiados, para descontentamento de Pinto da Costa. Prova da dimensão que o fenómeno atingiu foi a variedade de depoimentos de figuras públicas a dizer, sinceramente ou não, como gostavam do programa em que eram caricaturadas. Na hora do fim, resta a memória de “filmes”, “canções” e “anúncios” inesquecíveis e daquela que foi a melhor adaptação para televisão do espírito do cartoon político português.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Je joue aux pirates avec mes camarades


O breve texto na contracapa do catálogo de Natal das livrarias Bertrand, que procura promover os livros como presentes ideais, possui frases curiosas. Dirigindo-se ao leitor/consumidor, a Bertrand pergunta: “Que presentes costuma oferecer? Vinhos, perfume, roupas, brinquedos? Então porque não oferecer um bom livro sobre esse tema.” Será que uma criança de seis anos fica mais contente com um livro sobre a história dos brinquedos que com um brinquedo a sério? No entanto, o fundamental surge depois: “Este catálogo encontra-se dividido por temas para que seja mais fácil descobrir o livro de cozinha para (a) avó, a biografia para o pai ou as últimas novidades de romance para a mãe.” Encontra-se numa única frase uma série de estereótipos ligados ao género.

Que personagens temos aqui? Primeiro, a avó, já meio senil e educada numa época em que as mulheres da classe média pouco mais faziam que cozinhar. É a anciã que prepara refeições especiais para toda a família, sobretudo os mimos de que os netos tanto gostam. Não se lhe conhecem quaisquer interesses lúdicos ou intelectuais (como não se fala do avô, talvez ele já tenha morrido por consumir muito álcool e tabaco, como é próprio dos homens a sério). Depois, o pai, um homem sério e racional, leitor do Público e do Expresso, habituado ao estudo das grandes questões da actualidade. Provavelmente ocupa um cargo de decisão e procura inspiração nas biografias de grandes homens de Estado como César e Churchill. Não tem tempo para ler foleirices como poesia ou literatura. Por fim, a mãe, que, por ser mulher, é sensível e generosa, sobrepondo a emoção à razão. Desinteressada dos clássicos, procura romances acabados de chegar ao mercado, sobretudo de autores americanos best-sellers. Os sentimentos das personagens em busca do amor e da felicidade fazem-na sonhar e compensam a banalidade de uma vida passada a lavar a roupa do pai e a cuidar dos filhos. Estes últimos não parecem ser um mercado explorado pela Bertrand, apesar do catálogo incluir secções de carácter infantil e juvenil.

Um problema de certa publicidade é que aponta para grupos predefinidos de consumidores absolutamente homogéneos, o que no caso dos livros é um grave erro. Qualquer leitor tem direito a ler o que lhe apeteça, por mais inesperado que seja e independentemente da sua idade ou posição social.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

É proibido pintar a letra P na parede


Com alguns anos de atraso em relação aos seus principais rivais, o Sporting incluiu publicidade nas camisolas da sua equipa sénior de futebol em 1988/89, ao obter o patrocínio da empresa de ar condicionado Fnac (também parceira do Benfica). A partir daí, o clube leonino conheceria alguma instabilidade ao nível dos patrocínios, em contraste com a fidelidade do FC Porto aos azulejos Revigrés. Na temporada de 1989/90, os automóveis Nissan foram anunciados nas camisolas do SCP, seguindo-se a seguradora Bonança (1990/91 e 1991/92), a água do Caramulo (1992/93), a cerveja Faxe (1993/94), o queijo Castelões (1994/95), cuja camisola foi envergada pela equipa de Figo na vitória no Jamor, e a televisão SIC (1995/96). Em 1996, a Telecel assegurou a presença do seu logótipo nos equipamentos dos três “grandes”, dando início ao ascendente das empresas de comunicações na publicidade futebolística. Os conteúdos publicitários tornaram-se cada vez mais importantes no futebol português, o que originou as actuais Ligas Zon Sagres e Orangina.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Põe nessa boca uma chupeta


Ontem ouvi uma das minhas cassetes áudio, o que não fazia desde o início da década. Felizmente o pouco usado leitor ainda funciona. A propósito de música que ouvia antigamente, lembrei-me da saudosa emissora local odivelense Rádio Nova Antena (RNA), cujos estúdios se localizaram no Barruncho e depois na Ramada. A frequência outrora pertencente à RNA foi ocupada e colonizada pelo fado.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Vamos nessa, Vanessa


Num texto no Jornal de Notícias, Mário Contumélias critica o programa da RTP Herman 2010, que considera seco e desinteressante. Como é habitual em críticas negativas sobre o trabalho do “verdadeiro artista”, o autor começa por lembrar o passado brilhante e acutilante de Herman José e chega à parte em que, algures após Herman Enciclopédia, o humorista enveredou por maus caminhos e nunca mais foi o mesmo, entorpecido pelas delícias da vida burguesa. Na verdade, acho que Herman 2010 é, em muito tempo, o programa no qual o artista de variedades se sente mais à vontade e um talk-show de bom gosto eficazmente conduzido. Claro que não é perfeito. Em particular, as piadas da introdução raramente resultam, embora Herman dê um ar da sua graça ao cantar, imitar e lançar expressões como “Tá tudo?” e “Tenksl diga”. Quanto aos convidados, é verdade que o programa podia ser gravado em casa de Herman (talvez com mais espaço que o estúdio), o qual convoca para os sofás sobretudo elementos do seu bando (Ana Bola, Maria Rueff, Cândido Mota, Lídia Franco, Joaquim Monchique, José Pedro Gomes, etc.) e amigos ou pessoas que admira, mas, para além de outros talk-shows seguirem uma orientação semelhante, a familiaridade entre anfitrião e entrevistados contribui para que a conversa flua melhor e se relembrem episódios curiosos. As imagens de arquivo são utilizadas na proporção certa, evitando preencher demasiado tempo com nostalgia. O agrado provocado pelos sketches que Herman efectua juntamente com Manuel Marques varia conforme o dia ou o espectador, sem que deixem de incluir um toque pessoal e a habitual capacidade satírica. Por fim, os números musicais revelam bom gosto e a classe da banda de Pedro Duarte. Trata-se, basicamente, da fórmula de Herman SIC depurada em tempo de ecrã e orçamento, além de limada da atracção pelo pimba e pelo sensacionalismo. Ou seja, a prova de que Herman é único e ainda tem muito para dar à televisão, sem perder a espontaneidade.

O Ramiro torna-se o principal suspeito


A produção da TVI Meu Amor, criada por António Barreira, ganhou o prémio Emmy Internacional para Melhor Telenovela, derrotando as outras duas nomeadas. Por isso, muitos parabéns a toda a equipa da novela pelo reconhecimento internacional que obteve. Pessoalmente, não achei que Meu Amor fosse melhor que muitas outras telenovelas que a TVI já exibiu. No entanto, a vitória em Nova Iorque acaba por consagrar o “modelo de produção” português, compensando as verbas elevadas envolvidas num projecto deste tipo. O ponto forte dos 319 episódios (uff…) de Meu Amor foi o elenco, com interpretações de alto nível de actores como Nicolau Breyner, Alexandra Lencastre, Margarida Marinho, Paulo Pires, Lídia Franco, Manuel Cavaco, José Wallenstein, Cristina Homem de Mello e Marco d’Almeida. Outros intérpretes, como Rita Pereira e Rodrigo Menezes, limitaram-se a ser iguais a eles próprios. Os cenários e cenas de exteriores também foram bem conseguidos. Claro que a presença assídua da canção + 1 Dia, de José Cid, favoreceu o sucesso. Quanto à história, com as reviravoltas necessárias a uma narrativa tão longa, mostrou-se razoável, preenchendo-se o tempo que restava através de panorâmicas apelando ao turismo em Lisboa. No conjunto, um produto competente, sem ser particularmente estimulante. Resta saber como a TVI vai comemorar uma estatueta que nitidamente não esperava.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Desculpe mas eu vou ser padre


Diário de Lisboa, 31 de Dezembro de 1976

(Programação do “1º Programa” da RTP)
“ (…) 23.00 “Hotel Rite”. O show de fim de ano da RTP com texto de Ruy Andrade, José Andrade e Bê Veludo, dos Parodiantes de Lisboa, com Eugénio Salvador, Paulo de Carvalho, Nicolau Breyner, Tonicha, Paco Bandeira, Henrique Viana, Florbela Queirós, Simone, Octávio Matos, José Cid, Vera Mónica, Beatriz da Conceição, Herman José, Rodrigo, o Grupo Gemini, Vítor Mendes, o Conjunto Saga e Sinde Filipe, Joel Branco, Júlio Pereira, Spina, o conjunto de guitarras de José Luís Nobre Costa, Carlos Gonçalves, Rui de Moura Guedes, Óscar Acúrcio e os Ballets de Sérgio de Azevedo. Arranjos originais do maestro José Calvário. Realização de Luís Andrade. Produção de Nuno Maris, Óscar Acúrcio e António Andrade.
00.40 Fecho.” (p. 15)

domingo, 21 de novembro de 2010

Há animais que falam como nós


Os historiadores Fernando Rosas e Rui Ramos foram entrevistados por Joana Cruz no programa O Inimigo Público (canal Q), sorrindo com os gracejos da apresentadora e expondo as linhas fundamentais dos seus livros mais recentes. A versão televisiva do projecto multimédia das Produções Fictícias inclui sempre uma entrevista “divertida” ao autor de determinado livro lançado no mercado. Perante isto, para quando Ricardo Serrado no Q (o biógrafo de Cosme Damião já esteve no programa Em Linha, da Benfica TV)? A sua presença seria bastante útil, até porque o futebol português tem sido a fonte de muitas das piadas do IP. Na verdade, o suplemento humorístico do jornal Público, tal como as suas encarnações na televisão e na Internet, constituiu desde cedo um eficaz barómetro do ambiente futebolístico nacional, sobretudo ao apontar quem está “em cima” e “em baixo” (o Sporting tem estado quase sempre “em baixo”, mas Hélder Postiga conseguiu ultimamente colocar-se acima da chacota de Vítor Elias, António Marques e outros argumentistas do IP).

Do meu castro seres rainha


Há muito tempo, li a obra O Segredo de um Casamento (Guerra & Paz, 2009), de Rui Simões, ex-amigo e assessor de Filomena e Jorge Nuno Pinto da Costa. Num livro de que foram enviados imensos exemplares para as lojas (mas quantos terão sido realmente vendidos?), Simões, ressentido por não ter sido pago, procura expor os “podres” do então casal e a fachada que era o seu matrimónio. No fundo, pouco importa saber o que é ficção e o que é realidade na insólita história. Após concluir a leitura da obra, uma acção impõe-se como prioritária para o leitor: ficar bem longe do Rui, do Jorge e da Filomena.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Desce daí, ó Marquês, que eles já cá estão outra vez


Na Gala do Desporto, realizada hoje no Estoril, serão homenageadas as personalidades incluídas na lista dos 100 maiores nomes do desporto português nos últimos cem anos. A selecção, integrada nas comemorações do Centenário da República, foi feita pela Confederação do Desporto de Portugal, a partir de sugestões dadas pelas federações. Entre os cem escolhidos, encontra-se um número significativo de homens ligados ao futebol. Assim, no meio da lista hoje publicada em A Bola, podemos encontrar António Stromp (também praticante de atletismo, cricket, ténis e esgrima), Artur Jorge, Cândido de Oliveira, Cristiano Ronaldo, Eusébio da Silva Ferreira, Fernando Gomes, Guilherme Pinto Basto (a sua actividade desportiva não decorreu sobretudo antes da implantação da República?), Jesus Correia (também praticante de hóquei em patins), José Maria Pedroto, José Mourinho, José Torres, José Travassos, Luís Figo, Manuel da Luz Afonso, Mário Coluna, Matateu, Peyroteo, Ribeiro dos Reis, Rui Costa e Vítor Baía, com o treinador Orlando Duarte a representar o futsal. Mesmo sem entrarem em campo, os jornalistas Artur Agostinho e Vítor Santos mereceram entrar no rol de distinguidos pela CDP.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Mas foi bacalhau do melhor


Diário de Lisboa, 7 de Dezembro de 1976

“Na verdade, os bons ventos não estão com Vítor Baptista. No regresso de Chipre, abordado pelos jornalistas na Portela, o dianteiro benfiquista evidenciou, nitidamente, sinais de descontrolo que se avolumaram quando, a caminho de casa (em Setúbal), perdeu o domínio da sua viatura e sofreu um despiste.
O carro sofreu grossas avarias e Vítor Baptista partiu um dente da frente. Quando acorreram diversos populares para o livrarem da incómoda situação, Vítor Baptista afastou os presentes e começou, tranquilamente, a procurar o dente partido no meio do chão…” (p. 20)

domingo, 14 de novembro de 2010

Faltou-te um bocadinho assim


Entre os dias 3 e 24 de Abril de 1974, foram publicados quatro números da revista semanal Desporto, depois desaparecida subitamente. Com Manuel Sérgio como director, a nova revista procurava ser um projecto inovador, ao rejeitar aqueles que considerava serem defeitos da imprensa desportiva nacional, como o sensacionalismo, o culto das vedetas e o destaque conferido apenas ao “desporto-espectáculo” (nomeadamente o futebol profissional), em prejuízo do “desporto-lazer” e do “desporto-educação”. Nas cerca de 90 páginas dos números de Desporto, uma vasta redacção procura abordar a actualidade das 44 modalidades então praticadas em Portugal. Em cada edição, uma reportagem de Inácio Teigão faz o balanço da situação de uma modalidade no país (ciclismo, atletismo, hipismo e natação foram os temas analisados pelo jornalista). Artigos teóricos de autores nacionais (em especial Manuel Sérgio, já uma autoridade no pensamento sobre o desporto) e estrangeiros podem também ser encontrados nas páginas a preto e branco do periódico, que conta com fotógrafos como António Capela.

Apesar da censura, os textos da revista dão a entender um profundo descontentamento com a situação do desporto no Portugal de Marcelo Caetano, quanto mais não seja pelo número muito reduzido de praticantes e infra-estruturas adequadas. As modalidades mias mediáticas e profissionalizadas, o futebol e o ciclismo, apresentavam também múltiplos problemas, servindo apenas como entretenimento alienante. Alargar a prática desportiva entre as mulheres é também uma preocupação da publicação, inovadora na sua área ao possuir redactoras como Cândida Vieira e entrevistas a desportistas de relevo (o ainda incipiente futebol feminino não é referido em Desporto). 

Além dos acontecimentos do dia que se seguiu à publicação do último número da revista (nas bancas às quartas), as dificuldades comerciais e financeiras em manter um projecto deste tipo, sem grandes apoios publicitários, terão concorrido para o final de uma iniciativa muito interessante. Durante o período revolucionário, Manuel Sérgio e outros membros da redacção de Desporto, como Duarte Pimentel, iriam passar à prática, empenhando-se a fundo na criação de um “desporto novo num país novo”, envolvido no contexto político e ideológico da época.

Eu faço um buraco para a semente plantar


Fórum Estudante, 8 de Agosto de 1994

“ (Artigo sobre Geraldes Lino e a BD portuguesa)
(…) Jovens valores em fanzines e concursos: João Fazenda (tem 14 anos e é um autêntico “papa-concursos”). Outros jovens de grande talento são João Abranches, “Lacas”, Dinis Conefrey, Jorge Mateus, Luís Aveiro, Pepe d’El Rei, Renato de Abreu, Nazaré Álvares, Pedro Burgos.”

sábado, 13 de novembro de 2010

Para ter pão, preciso do padeiro


O Jornal de Odivelas de 11 de Novembro apresenta uma manchete insólita: “Odivelas veste camisola do SCP”. Na verdade, foi a presidente da Câmara, Susana Amador, que envergou um jersey verde e branco com o seu nome nas costas e autografado pelos jogadores da equipa de futsal do Sporting, ao assinar, juntamente com José Eduardo Bettencourt, o protocolo pelo qual o Pavilhão Multiusos de Odivelas será utilizado pelo SCP na organização do Grupo D da Ronda de Elite da UEFA Futsal Cup, entre 25 e 28 deste mês. O torneio será o primeiro evento desportivo oficial a decorrer no imponente Pavilhão Multiusos, uma obra de arte do arquitecto José Cid (acreditem ou não) localizada junto à Escola 2,3 dos Pombais e ao complexo do Odivelas FC. Os homens de Orlando Duarte irão defrontar a equipa checa do Era Pack Chrudim (25/11, 20.30), os romenos do City’US Tirgu-Mures (26/11, 20.30) e o El Pozo Múrcia (28/11, 15.00), de Espanha, numa poule cujo vencedor seguirá em frente na prova europeia. Os preços dos bilhetes variam entre 5 euros (um dia) e 10 euros (três dias). Para quem não puder ir ao Multiusos, prevê-se a cobertura televisiva da RTP2. Odivelas entra na rota do Desporto!

A partir de hoje, encontra-se no mercado livreiro a terceira obra de Ricardo Serrado, a biografia Cosme Damião: O homem que sonhou o Benfica (Zebra). O director do CHFD realiza um estudo pioneiro, prefaciado por Manuel Sérgio, sobre uma figura fundamental das primeiras décadas da história do futebol português (embora não seja necessário cair nos exageros do texto promocional), em especial do Sport Lisboa, que depois se tornou o Sport Lisboa e Benfica. O livro constitui uma prova da vitalidade da historiografia futebolística lusa e pode ser um presente de Natal ideal, quer para benfiquistas quer como provocação saudável a adeptos de outros clubes.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Listen to my sneaky scheme


Nas novelas da TVI, a direcção de actores é geralmente assegurada por outros actores. No caso de Espírito Indomável, é António Melo que dirige o trabalho dos intérpretes, de acordo com os créditos finais, que indicavam até há pouco tempo Paula Neves como sua assistente na função. Ontem, no entanto, o cargo de assistente de direcção de actores na novela de Coruche foi atribuído na ficha técnica a Joaquim Nicolau. A alteração deve-se naturalmente à necessidade de Paula Neves se concentrar na interpretação da sua personagem em Sedução (onde a direcção de actores está a cargo de Isabel Medina e Susana Arrais), uma jovem realizadora que pretende estrear-se nas longas-metragens com a adaptação do best-seller de uma escritora portuguesa (interpretada por Maria João Bastos).

A propósito disto, as adaptações de obras literárias para o cinema realizadas em Portugal raramente se baseiam em sucessos de vendas recentes (na televisão, Equador, de Miguel Sousa Tavares, deu origem a uma série de proporções inéditas), com a excepção de Uma Aventura na Casa Assombrada. Se os cineastas lusos resolvessem pegar nas histórias fornecidas pela actual ficção nacional, uma das escritoras candidatas naturais à adaptação seria Margarida Rebelo Pinto. Acontece que se ouviu falar há muitos anos na transposição do primeiro romance de Rebelo Pinto, Sei Lá, para o grande ecrã, tendo aliás o Círculo de Leitores lançado uma edição do livro com capa alusiva ao facto. Autora dos argumentos de uma curta-metragem e um telefilme, Margarida assinaria o guião do filme baseado na sua ficção. A entrada da Wikipedia sobre a escritora informa que esta terminou no ano passado o argumento da versão cinematográfica de Sei Lá. Mas esse filme alguma vez virá realmente a existir? Recordem-se as afirmações de Rebelo Pinto numa entrevista: “Gosto de cinema, mas em Portugal é muito complicado, porque não há indústria e toda a gente acha que temos de trabalhar pro bono. Para projectos comerciais não trabalho de borla. Não ofereço guiões a realizadores nem a produtores. E eles não pagam porque sou cara, porque sou uma marca e represento bilheteira.” (i, 4 de Janeiro de 2010) Parece existir aqui um caso de filme com argumento, mas sem realizador.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Quem vem aqui nunca está só


Diário da República, II Série, Nº 69, 23 de Março de 1978

“Por despacho de 28 de Fevereiro findo do Secretário de Estado do Ensino Superior:
Doutor Aníbal Cavaco Silva – designado vogal do conselho administrativo da Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa.
Faculdade de Economia, 14 de Março de 1978. – O Presidente da Comissão Instaladora, Alfredo António de Sousa.”

O menino pertence a uma classe sem futuro histórico


A medalha de Mérito Desportivo, criada em 1960 pelo Decreto-Lei nº 43 107, por iniciativa de Francisco Leite Pinto, então ministro da Educação Nacional, não deixou de ser atribuída pelo regime democrático aos atletas mais destacados. A gratidão do Estado português far-se-ia sentir junto dos desportistas que obtivessem bons resultados em competições internacionais, como os Jogos Olímpicos. Assim, são distinguidos com a medalha de Mérito Desportivo pelo ministro da Educação e Investigação Científica, Mário Sottomayor Cardia, os atletas medalhados nas Olimpíadas de Montreal Paulo de Eça Leal, Luís Cardoso de Meneses Margaride e Armando da Silva Marques, tal como o treinador da equipa nacional de atletismo, Mário Moniz Pereira (Diário da República, II Série, Nº 33, 9 de Fevereiro de 1977).

Outra distinção, a medalha de Bons Serviços Desportivos, seria atribuída a personalidades que, longe da ribalta, tivessem dedicado a sua vida ao desporto. Em Abril de 1978, surgem no DR (II Série) os casos de Celso Santos, massagista do clube portuense Salgueiros durante 50 anos (Nº 78, 4 de Abril), e Rogério da Fonseca Ramos, praticante de hóquei em campo no Clube Futebol Benfica durante trinta anos, “distinguindo-se por várias vezes como campeão regional, nacional e ainda integrando a selecção nacional, que capitaneou” (Nº 94, 22 de Abril), ambos medalhados por Cardia.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Junte o inútil ao desagradável


Diário do Governo, II Série, Nº 281, 5 de Dezembro de 1975

“Por despacho ministerial de 21 de Julho último, visado pelo Tribunal de Contas em 20 do corrente mês:
Capitão Henrique Carlos Malta Galvão – reintegrado, a título póstumo, como inspector superior de administração ultramarina, aposentado, de harmonia com o acórdão da Comissão para a Reintegração dos Servidores do Estado de 10 de Julho do corrente ano, homologado por despacho ministerial de 14 do mesmo mês, nos termos do artigo 2º, nº 1 e 3, do Decreto-Lei nº 173/74, de 26 de Abril, este aditado pelo Decreto-Lei nº 225/75, de 9 de Maio. (…)
Direcção-Geral de Administração Civil (Ministério da Cooperação), 28 de Novembro de 1975. – Pelo Director-Geral, Feliciano Marques.”

domingo, 7 de novembro de 2010

O macorvo e o caco


Eis os 10 programas televisivos mais marcantes da primeira década do século XXI:

Anjo Selvagem
Dei-te Quase Tudo
Deixa que Te Leve
Doce Fugitiva
Espírito Indomável
Fascínios
Ilha dos Amores
Meu Amor
Ninguém como Tu
Tempo de Viver

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Comeste o folar dos meus avós


A enciclopédia Lexicoteca – Moderna Enciclopédia Universal, publicada em 18 volumes pelo Círculo de Leitores, conheceu suplementos em 1988 e 1992, antes do volume 21 surgir em 1996, com informação relativa sobretudo aos quatro anos anteriores (1992-1995). A actualização de uma enciclopédia permite acrescentar dados a entradas biográficas já presentes nos primeiros volumes (assinaladas com um asterisco na nova edição) e incluir verbetes novos, abordando personalidades recentemente tornadas célebres. No caso da Lexicoteca, o volume 21 apresenta novas entradas sobre futebolistas, permitindo ter uma ideia de quais foram os valores consagrados ou revelados na primeira metade da década de 90 do século passado. Assim, entre portugueses e estrangeiros, surgem a negrito os nomes de Roberto Baggio, Vítor Baía (com fotografia), Franco Baresi, Bebeto, Butragueño, Claudio Caniggia, Rui Costa (fotografia), Fernando Couto (fotografia), Domingos (fotografia), Figo (fotografia), Ruud Gullit, Gary Lineker, Jean-Pierre Papin, João Pinto, João Vieira Pinto, Bernd Schuster, Paulo Sousa e Marco Van Basten.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Sem abraço, sem beijinho, sem aperto de mão

Porque é que, depois de publicar as Bíblias do Benfica e do Sporting, Luís Miguel Pereira não escreveu um livro semelhante sobre o FC Porto, resolvendo abordar antes a seleção do Brasil? São inegáveis o interesse e a riqueza da história dos pentacampeões mundiais. No entanto, os adeptos portistas vão continuar à espera da "sua" Bíblia, numa situação desfavorável. Nem seria difícil para o autor tratar da história portista, que já aflorou em Caretas do Porto e Somos os Melhores, Carago!

Senhor Deus, misericórdia!


Diário do Governo, II Série, Nº 223, 26 de Setembro de 1975

“Por despacho ministerial de 22 de Julho último:
David Marques, escrivão da Junta de Freguesia de Odivelas, concelho de Loures – demitido da função pública, nos termos do artigo 7º, nº 1, alínea b) do Decreto-Lei nº 123/75, de 11 de Março, com efeitos a partir de 25 de Julho de 1974.
Secretaria-Geral do Ministério (da Administração Interna), 17 de Setembro de 1975. – Servindo de Secretário-Geral, o Inspector Superior Administrativo, Manuel Pereira.”

terça-feira, 2 de novembro de 2010

Bandidos, tremei!


A propósito de golos esquisitos e de validade duvidosa, convém recordar o acontecimento referido por Fernando Correia em Histórias Proibidas (Livros do Brasil, 2008). O lance ocorreu na final do Campeonato de Portugal de 1936/37 (embora a temporada não seja indicada por Correia, que diz apenas que Manuel Marques, ou Manecas, já se fixara na equipa principal do Sporting), disputada no campo do Arnado, em Coimbra, por Sporting e FC Porto:

” (…) O jogo decorria equilibrado e a meio do segundo tempo estava empatado 0-0. Nessa altura, o avançado Reboredo, do FC Porto, jogou a bola com a mão dentro da grande área do Sporting. Ouviu-se um apito. Os jogadores das duas equipas pararam e Jurado, defesa dos “leões”, com toda a naturalidade, agarrou na bola e colocou-a no local da infracção para marcar o respectivo livre.
Perante o espanto geral, o árbitro aproximou-se e mandou marcar uma grande penalidade contra o Sporting, porque (explicou) não tinha apitado.
Vianinha (ex-jogador do Sporting) fez o golo do triunfo portista.
Para muitos, o que se passou foi incrível… mas verdadeiro.” (pp. 116-117)

Na verdade, o resultado antes do penálti era de 2-1 a favor do FCP. Mais tarde, Pireza faria o 3-2, estabelecendo o resultado final. O lance polémico não deixou de ser abordado na crónica do desafio publicada em Os Sports de 5 de Julho de 1937:

“ (…) A bola da vitória da equipa portuense derivou, todavia, de uma decisão errónea do juiz de campo (Santos Palma).
Quando, aos trinta e um minutos da segunda parte (…) se ouviu apitar, a impressão geral do público era, de facto, de que ia assistir-se à marcação de um “livre” contra o Porto. Mas, afinal, o jogo foi reatado com um “penalty” contra o Sporting por falta de “mão”, aliás desculpável e verificada depois da do portuense, atribuída ao defesa direito lisboeta.
A saída da partida derradeira do campeonato de 1937 teve, assim, aquele “lance de lotaria” que os ingleses dizem fazer parte fatal de todas as partidas de grande importância, principalmente de final. (...)”

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Senti-me um macho falhado


O Diploma Legislativo nº 3208, de 17 de Janeiro de 1962, assinado pelo governador-geral de Angola, Venâncio Deslandes, regula as actividades gimnodesportivas na então colónia portuguesa. De acordo com o diploma, o Conselho Provincial de Educação Física (CPEF), criado em 1956, é a principal entidade reguladora do desporto angolano, impondo aos privados (clubes e associações) as orientações estatais e assumindo um papel semelhante ao que a Direcção-Geral de Educação Física, Desportos e Saúde Escolar detinha na metrópole. Em todas as instalações desportivas da “Província de Angola”, teria que existir um camarote ou lugares de primeira categoria reservados exclusivamente aos representantes do CPEF (artigo 84º). 

Os clubes angolanos estão sujeitos a múltiplas exigências do CPEF, de cujo parecer depende a autorização conferida pelo governador à criação de determinada colectividade e a aprovação dos seus corpos gerentes. Os nomes escolhidos nas assembleias-gerais seriam remetidos a Luanda num prazo de dez dias após a eleição dos dirigentes clubísticos, que só assumiriam funções depois da publicação no Boletim Oficial do despacho do governador sancionando a eleição. Clubes e associações poderiam ser extintos caso exercessem qualquer actividade “contrária à ordem social” (artigo 54º). A situação financeira dos clubes seria controlada através do envio ao CPEF dos projectos de orçamento e de relatórios anuais da gerência. A aprovação oficial seria igualmente necessária quanto às infra-estruturas desportivas, sujeitas a vistoria de modo a saber se possuíam as condições “indispensáveis ao mínimo satisfatório à eficiência do ensino” (artigo 105º) da ginástica, cuja prática é obrigatória para os clubes, que não poderiam realizar obras nas suas instalações sem apresentar os respectivos projectos ao Conselho Provincial. O CPEF superintende ainda assuntos como as transferências e a participação de atletas angolanos em competições internacionais.

Em Julho de 1975, o presidente do então apenas Conselho de Educação Física de Angola é Daniel Rogério Leite, inspector de Educação Física e Desportos, que passa à situação de aposentado (Diário do Governo, II Série, nº 156, 9 de Julho de 1975).

I left the sunshine and the vineyards of my valley


Por volta de 1996, Inês de Medeiros apresentava na RTP2 o programa O Filme da Minha Vida, onde figuras públicas escolhiam a sua longa-metragem preferida, que seria exibida a seguir ao diálogo da apresentadora com o convidado. Esse espaço televisivo, recentemente lembrado pelos promotores de uma petição em defesa da melhoria da programação cinematográfica do segundo canal público, foi importante na divulgação de clássicos da Sétima Arte, além de permitir conhecer melhor os convidados. No entanto, só consigo recordar especificamente as escolhas de cinco celebridades: António Guterres (O Mundo a Seus Pés), Jorge Sampaio (O Leopardo), António Sala (Clube dos Poetas Mortos), Ana Bola (Monty Python e o Cálice Sagrado) e Cecília Carmo (Kramer Contra Kramer). Seria interessante se alguém soubesse de outras participações no programa de Inês de Medeiros.