Um Risco na Areia (Avante,
2000), romance de Manuel Tiago (pseudónimo de Álvaro Cunhal), evoca o ambiente
de Setembro de 1974, nomeadamente a oposição do PCP à manifestação da “maioria
silenciosa” marcada para dia 28 desse mês (curiosamente, no romance nunca é
referido pelo narrador ou pelas personagens o nome de Spínola, designado por “o
presidente”, ou de qualquer outro político da época). A partir do centro de
trabalho de uma freguesia de Lisboa, é mostrada a actividade incessante dos
militantes comunistas, assim como os confrontos físicos entre jovens do PCP e
do MRPP (“os emeérres”) e os ataques ao Partido de grupos “fascistas”, que
multiplicam agressões e provocações nas vésperas do 28 de Setembro.
Literariamente, Um Risco na Areia não
possui grande valor, já que, neste romance, Cunhal acaba por dar mais espaço à
exposição das suas posições políticas que ao desenvolvimento das personagens,
de quem ficamos a saber pouco mais que os nomes.
A bibliografia da
obra de Raquel Varela A História do PCP
na Revolução dos Cravos (Bertrand, 2011) não inclui o título de Um Risco na Areia, o que se revela uma
lacuna (sem pôr em causa a qualidade da tese da autora), tendo em conta o
carácter quer de testemunho quer de propaganda que Cunhal fornece à sua
reconstituição dos eventos de Setembro de 1974. O romance aponta como uma das
actividades mais importantes dos militantes lisboetas o acompanhamento das
lutas nas fábricas, onde os operários revoltados constituirão um campo de
recrutamento para o PCP. Perante as situações de sabotagem económica, ligadas à
preparação do alegado golpe de direita, representantes dos trabalhadores de uma
empresa pedem conselho a um dirigente do PCP, recebendo como resposta “pronta e
sem hesitar”: “Tomem conta da fábrica e mantenham-na em laboração” (p. 23),
solução depois aprovada em plenário da empresa. A autogestão e o controlo
operário teriam assim sido incentivados em 1974 pelo partido de Álvaro Cunhal,
cuja versão colide com o livro de Raquel Varela (segundo a historiadora, os
comunistas privilegiavam então a intervenção estatal em empresas alvo de
sabotagem económica, dissuadindo as iniciativas operárias de ocupação das
fábricas e auto-organização).
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