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sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Em Portugal qualquer coisa falhou



Um Risco na Areia (Avante, 2000), romance de Manuel Tiago (pseudónimo de Álvaro Cunhal), evoca o ambiente de Setembro de 1974, nomeadamente a oposição do PCP à manifestação da “maioria silenciosa” marcada para dia 28 desse mês (curiosamente, no romance nunca é referido pelo narrador ou pelas personagens o nome de Spínola, designado por “o presidente”, ou de qualquer outro político da época). A partir do centro de trabalho de uma freguesia de Lisboa, é mostrada a actividade incessante dos militantes comunistas, assim como os confrontos físicos entre jovens do PCP e do MRPP (“os emeérres”) e os ataques ao Partido de grupos “fascistas”, que multiplicam agressões e provocações nas vésperas do 28 de Setembro. Literariamente, Um Risco na Areia não possui grande valor, já que, neste romance, Cunhal acaba por dar mais espaço à exposição das suas posições políticas que ao desenvolvimento das personagens, de quem ficamos a saber pouco mais que os nomes.

A bibliografia da obra de Raquel Varela A História do PCP na Revolução dos Cravos (Bertrand, 2011) não inclui o título de Um Risco na Areia, o que se revela uma lacuna (sem pôr em causa a qualidade da tese da autora), tendo em conta o carácter quer de testemunho quer de propaganda que Cunhal fornece à sua reconstituição dos eventos de Setembro de 1974. O romance aponta como uma das actividades mais importantes dos militantes lisboetas o acompanhamento das lutas nas fábricas, onde os operários revoltados constituirão um campo de recrutamento para o PCP. Perante as situações de sabotagem económica, ligadas à preparação do alegado golpe de direita, representantes dos trabalhadores de uma empresa pedem conselho a um dirigente do PCP, recebendo como resposta “pronta e sem hesitar”: “Tomem conta da fábrica e mantenham-na em laboração” (p. 23), solução depois aprovada em plenário da empresa. A autogestão e o controlo operário teriam assim sido incentivados em 1974 pelo partido de Álvaro Cunhal, cuja versão colide com o livro de Raquel Varela (segundo a historiadora, os comunistas privilegiavam então a intervenção estatal em empresas alvo de sabotagem económica, dissuadindo as iniciativas operárias de ocupação das fábricas e auto-organização).

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