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domingo, 18 de dezembro de 2011

A senhora lava a Coina todos os dias?

Em 1954, a revista cultural Cidade Nova, de Coimbra, editou um suplemento ao seu número 4-5 com o título “A Cidade Nova defende a Índia Portuguesa”. O volume constitui uma compilação de textos em resposta às pretensões da União Indiana de integrar no seu território Goa, Damão e Diu, hipótese que o Governo português recusa admitir, tornando previsível a resolução do conflito por via militar, como veio a acontecer há 50 anos. Os autores que colaboram com a Cidade Nova, vários dos quais se assumem como monárquicos, colocam a possibilidade de um confronto militar, mas, longe de o rejeitarem, apontam-no como preferível a qualquer cedência perante o primeiro-ministro indiano Nehru. Afinal, Goa pertence a Portugal e “os povos não são livres de perder pedaços da sua própria carne” (p. 317).

Dois dos participantes no volume são Sophia de Mello Breyner Andresen (autora do poema “Caminho da Índia”) e Francisco de Sousa Tavares. Este último, apesar das suas divergências com o salazarismo, coloca a questão da Índia no plano dos interesses nacionais, que o Governo defende com a sua posição intransigente, merecendo assim um “apoio sincero, entusiástico e de voluntário sacrifício” (p. 332) por parte dos monárquicos portugueses. Posição idêntica é defendida por Luís Filipe Demony (presidente da Câmara Municipal de Loures quando ocorre o 25 de Abril), dirigente da organização “Unidade Tradicionalista”, o qual se serve de versos de Os Lusíadas para apelar a novos feitos gloriosos na “nova e grande aventura da Índia” (p. 339).

Perante a ameaça à integridade nacional, o discurso do suplemento da Cidade Nova é claramente belicista, incluindo o insólito texto “Viva a Guerra”, assinado por “Azinhal Abelho”, no qual se encontram aforismos como “A guerra não é a morte, mas a vitória do homem sobre a morte” ou “A guerra é como o fogo – purifica” (pp. 311-313). A hipótese de uma “defesa simbólica” de Goa que se limitasse a proteger a honra nacional apesar da derrota é atacada por Carlos Amado, para quem a história portuguesa é feita de “uma série ininterrupta de vitórias sobre inimigos mais numerosos e quase sempre de maior poder bélico” (p. 317). Resistir até ao fim seria a única opção, até porque, como lembra Carlos Eduardo de Soveral, a atitude portuguesa em Goa, Damão e Diu mostrará “o que estaremos decididos a fazer se for a nossa soberania atacada noutro ponto” (p. 319). Para o mesmo autor, “Chegou a hora da Consagração, ou do contrário dela, o que Deus não permita.” (p. 320)

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