Entre as “personagens” recentes da literatura autobiográfica portuguesa, uma das que compreendo melhor é o José Luís Pinto de Sá de Conquistadores de Almas (Guerra & Paz, 2006): ingénuo, com dificuldades de adaptação, carente de afecto, sem vocação para herói, manipulado e oprimido por gente mais esperta e poderosa. A editora Alêtheia tem publicado “aventuras” de outras figuras interessantes, como Zita Seabra, Pedro Santana Lopes e Maria Filomena Mónica (embora em Bilhete de Identidade a descrição dos sentimentos da protagonista seja tão exaustiva que o leitor pergunta-se o que tem a ver com aquilo). É preciso ter em conta que uma autobiografia cria sempre uma personagem a que o autor procura conferir verosimilhança. No caso de Jorge Nuno Pinto da Costa (Largos Dias Têm Cem Anos), a imaginação chega ao ponto de criar um dirigente desportivo sem apego ao poder. Sobre os livros de Diogo Freitas do Amaral (O Antigo Regime e a Revolução, A Transição para a Democracia, Ao Correr da Memória), é difícil ajuizar porque li apenas alguns excertos, embora seja notável a forma como, entre a emoção, a serenidade e o humor negro, Freitas recorda a noite da morte de Sá Carneiro e Amaro da Costa. Outro dos fundadores do regime, Mário Soares, apresentou as suas memórias (ainda que não as tenha escrito), ou antes, a sua versão da História, através das entrevistas a Maria João Avillez. Seja como for, é ponto assente que o autor português que com maior brilho desenvolve a arte de falar do seu próprio passado, em crónicas e romances, é António Lobo Antunes.
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