República, 25 de Setembro de 1975, p. 11
“Eusébio: Quem foste? Quem serviste? Quem serves?
Foste o ídolo de milhões de homens e crianças de um país sem pão. De um país sem liberdade e sem esperança.
Foste um campeão a partir do impossível. Só porque nasceste já campeão.
Foste um proletário do desporto. Bem pago, é certo. Sem que disso tivesses qualquer culpa.
Serviram-se de ti para mostrar ao mundo um desporto que nunca tivemos. Porque era mais fácil promover um campeão do que construir um desporto.
Serviram-se dos teus golos e das tuas “botas de ouro”, que correram mundo, para mostrarem a nossa “superioridade” desportiva. Para disfarçarem as nossas múltiplas insuficiências.
Serviram-se de ti para fazerem os seus negócios chorudos. Para venderem mais jornais. Para encherem os bolsos. Para se promoverem em caixa alta.
Serviram-se de ti para saciares a angústia de cada um de nós. Para esquecermos as nossas carências. Para adiarmos as nossas lutas.
Serviram-se de ti para que ganhássemos o impossível. Impuseram-te a obrigação de ganhares. Sempre te negaram o direito do fracasso.
Hoje continuas a servir os teus exploradores. Apenas mudaram de nome. Mudaram de sítio. De país. Mas não deixam de ser os mesmos abutres ávidos.
Hoje continuas a servir os que não cansam de te explorar. Querem sugar-te até à última finta. Até ao último golo…
Até onde chegarão?”
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