O Século, 9 de Maio de 1975
José Raimundo, “A libertação dos escravos” (p. 5)
“A situação dos jogadores do nosso futebol profissional não é de espantar. Os “donos” dos jogadores eram, também, donos de operários, de trabalhadores a quem quotidianamente exploravam e a quem não admitiam a menor acção reivindicativa para aumento de salário. A PIDE e as forças repressivas lá estavam sempre “à coca”. Quem eram os grandes mecenas dos clubes? Adolfo e Jorge Vieira de Brito, no Benfica; Cazal-Ribeiro, Brás Medeiros, José Matias, no Sporting; Bulhosa, no Belenenses; Pinto de Magalhães, no FC Porto; Xavier de Lima, no Vitória de Setúbal.
Tínhamos e temos milhares de desportistas de bancada. Que, na sua grande maioria, nunca praticaram desporto. Por falta de tempos livres, porque, explorados pelos patrões até à medula, tinham de fazer horas extraordinárias. Pequenos estádios polivalentes nos bairros e nas vilas? Não. Enormes estádios para os trabalhadores estafados verem o grande espectáculo que o companheiro de classe do patrão lhes oferecia através de outros escravos: os jogadores de futebol. E, entre escravos e escravos, trocavam-se apupos, e o jogador que falhava o golo era vaiado. Porque, para quem nunca praticou desporto, é difícil admitir a falha. Nos campos de futebol descarregava-se a má disposição da vida difícil.
Com o futebol, a adesão maciça das massas a uma alienação incentivada pela burguesia exploradora. Com o Totobola, a outra alienação. À semelhança do burguês que nada produz, a saída do “treze” que abre o caminho para ter dinheiro e nada fazer. Ou ter dinheiro para passar de explorado a explorador.
Hoje, a consciência profissional do jogador de futebol desperta e afirma-se. E, com ela, desperta também a consciência das massas que gostam de assistir ao espectáculo do futebol.
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